Diante de qualquer circunstância na vida haverá sempre duas atitudes possíveis: aquela que vem de um lugar de medo e aquela que vem de um lugar de amor. Trata-se de uma dicotomia universal, e não há de verdade uma terceira via.
Somos encorajados, dentro desse arranjo social em que vivemos, a escutar a voz que vem de um lugar de medo e a usá-la como orientação para que tomemos atitudes.
O medo que ecoa pela voz de William Bonner diariamente, replicado por todas as instituições durante as 24 horas do dia. O medo que entra na corrente sanguínea e que penetra em cada uma de nossas células. O medo que nos faz aceitar sermos vigiados, espionados, controlados.
O medo que cria o teatro da separação entre todos nós porque é a ilusão de que estamos separados, a ilusão de que não fazemos parte de uma mesma substância, que faz com que nos submetamos a ser escravizados; por empregos que nos desumanizam, que nos esvaziam de nós mesmos, que nos transformam em coisas.
O medo que nos instrui desde pequenos a competir, a ser melhor do que a pessoa que está ao seu lado, a superá-la de todas as formas possíveis.
O problema é que o medo silencia o amor. Assim como a noite e o dia, o medo e o amor não podem ser experimentados ao mesmo tempo; é ou um ou outro.
Do mesmo jeito, Liberdade e segurança se manifestam como opostos.
Liberdade joga o jogo do amor, enquanto a segurança joga o jogo do medo. Estão em arenas opostas. E, outra vez, esse nosso arranjo social vai sempre nos incentivar a optar pela segurança, exigindo que abramos mão da Liberdade.
Esses são paradigmas universais, que valem para tudo na vida, de relações pessoais, a trabalho a condição humana. A todos os instantes fazemos escolhas, ainda que não nos demos conta delas.
E o fato de escolhermos sem pensar é o ideal para o sistema: significa que fomos adequadamente programados de modo a perpetuar o arranjo, de modo a não questionar o estado das coisas, de modo a seguir orientados e orientadas pelo medo e por uma ilusória necessidade de segurança.
Para manter a todos nós ligeiramente acordados — porque, afinal, é preciso que consumamos sem pensar e sem parar, e se estivermos totalmente conscientes ou totalmente dormentes não consumiremos de forma descontrolada, como se espera que façamos — cria-se margem para que debatamos a situação, só que, como explica o linguista e ativista Noam Chomsky, “a forma inteligente de manter as pessoas passivas e obedientes é limitar de forma rígida o escopo da opinião aceitável, mas aceitar um debate apaixonado dentro desse escopo”.
Dentro desse certo escopo podemos nos digladiar debatendo Dilma, Lula, Temer, Aécio e Doria como se esse fosse um debate significativo quando o debate que importa está fora do escopo e tem a ver com o sistema econômico, com a concentração de renda e de poder, com a ditadura das corporações, com a possibilidade de a humanidade acabar, com a opressão e a repressão, com o fato de oito homens possuirem a mesma riqueza de metade da população do planeta. Mas esse debate não podemos ter.
O recado é dado de forma bastante delicada: as corporações de mídia, que ajudam a estabelecer o escopo, ignoram os temas de real importância jogando luz nessa batalha inócua que envolve nomes e partidos e corrupção.
Não se fala em coerção, repressão, opressão. Não se fala em conflito de classes. Não se fala em qualidade de trabalho. Não se fala na possibilidade real de o mundo ser destruído por um sistema que todos os dias tortura o planeta.
Limitando o escopo, mas aceitando o debate apaixonado dentro desse limite, vai sempre parecer que somos livres para debater, mas essa é uma Liberdade falsa porque a verdadeira Liberdade não aceita limites.
Apequenados, separados, amedrontados e privados de nós mesmos acabamos aceitando as regras desse jogo maluco.
“Estamos vivendo sob uma ditadura de classes”, disse Michel Foucault durante um debate com Noam Chomsky em 1971 a respeito da natureza humana. “Um poder de classes que se impõe pela violência, mesmo quando os instrumentos dessa violência são institucionais e constitucionais”.
E ele segue: “Todo o método de ensino que parece simplesmente querer propagar conhecimento é feito para manter uma certa classe no poder e para excluir os instrumentos de poder de outra classe”.
É disso que se trata: de consciência de classe. É esse o debate que está fora do escopo permitido. E portanto é esse o debate que precisa ser trazido à luz. No Brasil e no mundo.
Porque o sistema que aí está não caiu dos céus, não foi sugerido pelas escrituras, não foi ordem divina. Ele foi criado pelo homem; e o que o homem criou o homem pode destruir, porque em relação a esse sistema o trágico é que se nós não os destruirmos ele nos destruirá.
Há duas coisas ilimitadas nas nossas vidas: a capacidade de amar e de sonhar. Como seria, então, uma sociedade baseada no amor e não no medo? Como seria uma sociedade baseada na cooperação e não na competição?
Que lindo seria criar um outro ser humano para cooperar e não para competir, para voar e não para se escravizar, para amar e não para temer. Que lindo seria.
Oh Milly, você é fabulosa! Considero-a minha amiga! Grande abraço! E obrigado pelos textos inteligentes!
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Eu que agradeço, Roberto ❤
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texto para ler, reler, digerir e agir no renovar os sentimentos …
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