Com frases como “a Cracolândia acabou” e “não vai ter mais Cracolância em São Paulo” a administração de João Doria decretou o sucesso da operação que conduziu com a PM na região paulistana que é uma espécie de centro de usuários de drogas e de traficantes.
Se essa é a solução para acabar com o consumo e com o tráfico então o prefeito de São Paulo precisa avisar o resto do mundo que descobriu como eliminar um dos grandes males da sociedade atual.
Claro que se João Trabalhador, como gosta de ser chamado, for a ONU narrar a operação que sua administração conduziu na Cracolândia ele deixaria a audiência enojada e enjoada. Sob todos os ângulos a ação foi desumana, cruel e autoritária.
Tratar o ser humano como barata não pode ser solução para coisa nenhuma. As imagens da auto-aclamada operação na Cracolândia chocam, enjooam e envergonham. Declarar que a Cracolândia acabou é uma mistura de arrogância, burrice e completa falta de capacidade cognitiva.
A Cracolândia não é um lugar, é um estado de coisas; não é uma região da cidade, mas uma região da condição humana. Não se acaba com a Cracolância tirando ela da frente de nossos olhos frágeis que preferem enxergar apenas o belo.
Espalhar o usuário pela cidade, prender uma dúzia de traficantes e esfregas as ruas com sabão não vai dar fim a problema algum, nem eliminar a Cracolândia.
Mas Doria está obcecado com a tal da Cidade Linda que embala seus sonhos marqueteiros, e é evidente que uma cidade que reserva uma região para os noias não pode ser assim tão linda.
É urgente acabar com essa feiura, e que se dane tentar entender por que essa gente se submete a viver como bicho porque eu não quero mais esse povo sujo e fedido na minha frente e eu sou o CEO e mando nessa porra.
A Cracolândia incomoda porque deixa na nossa cara uma das mais cruéis mazelas de um sistema que não é capaz de acolher a todos. Estão bem ali na frente esses zumbis que, sem trabalho e sem um lar, passam o dia a se entorpecer na desesperada tentativa de escapar de uma realidade que não suportam mais.
A classe alta faz a mesma coisa, mas ao contrário do cheiro que os noia exalam, usa e abusa de drogas em locais privados, limpos e protegidos de investidas da polícia.
Estudos a respeito do uso e abuso de drogas indicam que prevenção e tratamento são as ações mais baratas e eficientes para lidar com o problema, e que mandar a policia acabar com a cena do crime é, além de ineficaz, caro. É inimaginável que declaremos guerra policial às drogas sabendo que é caro, ineficiente e imoral.
Qualquer pessoa com um mínimo de boa vontade entende que Doria não está preocupado com as drogas, nem com o abuso delas, mas com a beleza da cidade. É, portanto, uma guerra higienista, um esforço para tirar da nossa frente aqueles cidadãos considerados perigosos a nossa segurança quando já sabemos que os cidadãos mais perigosos a nossa segurança estão fazendo as leis e administrando a nação.
E que enquanto eles seguirem nesse jogo sórdido de manter o excesso de capital girando entre eles e alimentando toda a promiscuidade da tirania privada não haverá fim de Cracolândia alguma, ainda que ela, aparentemente, tenha saído das nossas fuças.
O que Doria está fazendo com essa administração higienista em nome do que considera ser belo e agradável aos olhos tem outro nome: se chama guerra de classes.
Republicou isso em O LADO ESCURO DA LUA.
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As ações do prefeito marqueteiro são de uma frieza impar. Triste etapa da vida a que chagamos como seres humanos.
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Oi, Milly.
Quando falou em tratar humanos como baratas, lembrei-me do episódio Engenharia Reversa da série Black Mirror. Impossível não associar o que o prefake e o picolé de chuchu fizeram na cracolândia a isso. Se ainda não viu, sugiro fortemente.
Abs,
João.
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tem toda a razão, João.
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Em tempos sombrios o humor não nos salva mas suaviza. Adorei um meme do João Dória chegando á Capela Sistina e mandando pintar de cinza achando que era um grafite de mal gosto e com muita informação! “Enquanto os homens exercem seus podres poderes…”
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